Texto escrito dia 20/03/19 ao cruzar fronteira Moçambique com a África do Sul
Uma viajante nata e ainda tenho medo de passar pela imigração para carimbar meu passaporte.
Como assim Rebecca?
Não sei explicar, espera acho que sei explicar…
Não é comum negras e negros viajarem e obviamente uma brasileira negra ou uma mulher latina americana, causa estranheza ao encontrarem livre, leve e solta.
Tenho que contar que não tive muitas experiências agradáveis nas fronteiras como na saída da Bolívia 🇧🇴 em 2010 ao retornar ao Brasil. No aeroporto me pediram para que eu tirasse a roupa e ficasse de cócoras, oi? Eu falo muito bem espanhol, estava sozinha e me espantou quando pediram para eu entrar em uma sala sozinha…. fiquei assustada e entrei. Eu entendia quando as polícias me ordenaram: “tira a roupa!”. Eu relutei, e fingia não entender uma palavra, elas eram incisivas e ainda pediam para eu tirar a roupa e ficar de cócoras. Eu fingia ser muito tapada e não obedecia os comandos, me passando por desentendida. Perguntavam incisivamente o que eu fazia na Bolívia sozinha, quanto tempo eu tinha ficado e o que fazia esse tempo por lá. Eu tremia, tremia e respondia essas perguntas básicas. Estava sendo violentada na imigração, eu não era o tipo de viajante que eles costumavam ver, eu estava a sofrer racismo!
Sem muito prolongar, me deixaram partir viram que eu era apenas uma aventureira em mundo alheio, não precisei tirar a roupa e nem ficar de cócoras. É acho que depois disso, meu medo de fronteiras faz sentido, muito sentido.Mas não parou por aí, quando cehguei no Brasil depois de uma viagem pela Bolívia tive minha bolsa revistada por inteira. Oh céus, precisa disso?
Na entrada no Uzbequistão 🇺🇿 procedimentos “padrão” revistaram meu computador, malas, hd, fotos no celular… jura que precisa isso? Até ouvir uma gracinha do tipo, que foto linda… ele estava me assediando, na situação de uma viajante querendo entrar no país é como levar um soco e não poder revidar.
Entrar no Cazaquistão eu tive muito medo, eu não estava ilegal, não havia pq ter medo, mas chamarem 4 polícias para conversar entre si, olharem meu passaporte, olharem o meu rosto, não sei o que eles tanto me olhavam, era como se eu fosse uma criminalista. Eu tremia, sou muito expressiva e tentava pensar o que passava na cabeça deles e o que eu tinha feito de errado, após pouco mais de 5 minutos eles disseram: pode ir! Até hoje não sei o que houve, mas eu tinha medo de voltar do Quirquistão pelo Cazaquistão e tudo isso acontecer novamente, eu estava certa no retorno questionavam meu visto.
Saindo do Tadjiquistão, após 1 ano e meio, muitos me conheciam, já estava como figurinha pública e como a garota Tajiquistão versão afro brasileira que morava em Kulob. Falava algumas coisas em tadjiqui, até que 3 mulheres me abordaram e me levaram pra salinha, nesta hora que as pernas tremiam a barriga gelava, ahhh não, logo eu a famosinha do Tadjiquistão? eu compreendia algumas palavras em Tadjiqui, mas me fingi de louca de não entender nada, perguntavam quanto eu tinha na carteira, eu dizia que não entendia, até eu responder que não tinha nada. Eu tinha dinheiro aliás estava indo para uma eurotrip, elas pegaram minha carteira, isso mesmo tiraram a carteira da minha mão e revistaram. Tinha dinheiro, tinha uma quantia razoável, mas eu escondi tão bem na carteira que elas não acharam. Me mandaram embora e não quiseram nem revistar minha bolsa, imaginavam que eu era uma mera coitada.
Meu passaporte atualmente tem 4 folhas sem carimbo, é comum eles perguntarem como eu consegui tudo isso? E o por que países tão estranhos e nada comum? Não me soa uma pergunta educada, não é mesmo?
Acho que tenho muitos relatos para ter medo dos guichês de imigração. Ser negra viajante não é algo muito comum, isso incomoda e sou, somos vítima de um racismo mundialmente institucional nesta sociedade.
Sonho no dia em que minhas pernas não tremam por medo da imigração. Que esse dia venha logo!
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